terça-feira, outubro 31, 2006

O terceiro preceito

Isn't the secret intent of this great Earth,
when it forces lovers together,
that inside their boundless emotion all things may shudder with joy?

Rainer Maria Rilke


O terceiro preceito - bem, isto dava um bom nome para um filme! Os cinco preceitos são regras básicas de treinamento observadas pelos budistas laicos. Temos estado a "revisitá-los" ao contrário (começámos com o quinto) nas sessões das quartas da UBP. Referi o quarto (a fala) e agora gostava de mencionar o terceiro, "Eu tomo o preceito de abster-me de comportamento sexual impróprio". Do ponto de vista do budismo a sexualidade é uma energia, uma força poderosa nas nossas vidas. Como com qualquer outro fenómeno, precisamos de estar atentos e aprender a usar essa energia habilmente. Para as pessoas sem votos monásticos, este preceito segue a linha directriz de qualquer acção, o princípio de não causar dano ou sofrimento, neste caso frequentemente expresso por honrar os nossos compromissos. Não se trata aqui de puritanismo, pois a via de Buda é essencialmente muito pragmática e o sexo gozava de muito boa saúde na Índia antiga. E precisamente porque a energia sexual era compreendida como sendo um elemento dinâmico na vida das pessoas, faz sentido incluí-la no contexto do caminho espiritual.

Basicamente, haverá duas formas "hábeis" de usar esta energia - como objecto de atenção, o que nos ajudará a reconhecer a natureza do desejo, ou como força transformadora, que é o método tântrico.

Ao usar a energia sexual como um qualquer outro objecto de atenção, podemos ver o quanto o desejo sexual pode está presente na mente e também que, como tudo o resto, como qualquer outro fenómeno, é transitório. A percepção libertadora pode vir de percebermos que não temos de fazer nada para que o desejo desapareça. Se nos sentarmos e observamos, veremos que o desejo vem e finalmente vai por si mesmo. Desta forma somos menos conduzidos pela força dos nossos desejos, não pensando que a nossa felicidade depende da sua satisfação. Podemos desfrutar dos prazeres dos sentidos quando surgem, mas deixamos de ser dominados por eles e estes deixam de ser a causa de acções prejudiciais.

O método tântrico fundamenta-se no conhecimento e na aplicação da energia. No Budismo, os Tantra fazem parte das escolas do Vajrayana desenvolvido no Tibete e Shingon no Japão. A palavra Tantra, continuum, refere-se à natureza da energia no seu estado primordial, que se manifesta sem interrupção. O domínio das energias do corpo, das emoções e da mente não é visto no Budismo como um fim em si mesmo mas como um meio para a realização do objectivo último de reconhecer a verdadeira natureza da realidade e poder dessa forma ajudar todos os seres, segundo o ideal do Bodhisattva. Subjacente ainda à prática dos Tantra, está a ideia de que certo tipo de práticas e ensinamentos, porventura mais simples, já não se aplicam a uma idade decadente (Kaliyuga) como aquela em que vivemos, em que têm de ser usados meios mais directos para a compreensão da realidade. Mas no Ocidente geralmente há aquela atitude de se querer a prática "mais elevada", o que apenas mostra uma completa incompreensão do caminho. De qualquer forma, não é uma questão de encontrar a prática mais "elevada" num sentido abstracto, mas aquela de que precisamos, que corresponde àquilo que honestamente somos, e que traz resultados... tangíveis.

Um texto que sempre achei interessante e inspirador, é o Red Thread of Zen, de Subhana Barzaghi, e que basicamente diz "We do not need to block our sexual energies, nor do we need to be a slave to them."

2 comentários:

Anónimo disse...

Perdi essa sessão de quarta, mas acabo de recuperá-la.Muito claro e esclarecedor o teu texto e aqueles para que apontas. Que bom!

Até quarta

Lucinda

Avusa disse...

Tenho vindo frequentemente ao teu blog e à "gota de orvalho".
Sou practicante na UBP de Lisboa e foi com surpresa que vi aqui o link para o meu blog. É apenas um blog de alguém que quer aprender…

Obrigado